sábado, 24 de março de 2012

Tudo o que todo mundo tem que saber sobre Música – no mínimo, tá? OU COMO TE CONVENCER DE QUE TEU CÉREBRO É REALMENTE CAPACITADO PARA A MÚSICA


              

Vamos voltar no tempo. Estamos agora a 40 mil anos atrás. Que tipo de ser humano vive nesse período da nossa Pré-História? Tu já notaste que nas imagens que vemos na mídia sobre o homem Pré-Histórico, é comum a representação de um ser com olhar duro e distante, desconfiado, vestido com andrajos e imundo - de picumã ou coisa pior - da cabeça com cabelos longos e encardidos até os pés descalços, com uma lança tosca na mão ou nas versões mais caricatas brandindo enorme e gordo tacape? Pois é. Durante a pesquisa, descobri que existe muitíssima informação, muitas camadas já descobertas sobre quem era e o que fazia, o que pensava esse humano de 40 mil anos. Claro que não podemos recriar suas ideias e intenções tal como fazemos uns com os outros hoje; não ha registros escritos desse período porque a escrita não existia ainda e a língua, que dentro da media entre as datas propostas entende-se que surgiu na forma atual entre 40 e 100 mil anos, ela também não possuía nem um décimo da complexidade, ou se preferirem, da riqueza semântica que possuímos hoje ao dizer um simples “Olá, como vai?”.




Caverna de Hohler Fels - Alemanha


      Veja bem a seriedade do que estou dizendo; a 40 mil anos o homem – especificamente na Europa, para este exemplo – ainda estava sofisticando a língua – sabe-se lá com que lentidão, afinal não temos como saber se a deriva de uma língua antiga era mais rápida ou o que é mais provável, mais lenta do que em línguas mais modernas como o latim, que em pouco mais de 1000 mil anos cresceu, disseminou-se literalmente por um quarto de mundo, depois foi tragado, engolido pelos povos colonizados que de falantes acabaram por ser os corruptores e lingófagos da língua romana. Em línguas antigas esse fenômeno pode ter levado dezenas de milhares de anos, mas só podemos conjecturar, pelo menos levando em conta aquilo que consegui ler, as informações que consegui juntar e por sentido, mas é bem plausível pensar que junto com a deriva humana pelo mundo, saindo da África a pelo menos 70 mil anos, qualquer forma, mesmo que incipiente de língua que essas pessoas possam ter falado, derivou, se transformou e se reformulou junto.


IMAGEM DO HOMEM PRÉ-HISTÓRICO


    A própria concepção social de família, de parentesco e de afetuosidade, o conceito de indivíduo que estas pessoas possuíam – parece até estranho chamar estas pessoas de pessoas, ou dizer que elas tinham conceito de alguma coisa - para o nosso senso comum, não existiam. Comparada com uma criança humana moderna, que é capaz de olhar para um tela de computador e jogar, conversar com varias outras crianças, por vezes em mais de uma língua, e tudo isso ao mesmo tempo e ouvindo música, qual era o tipo, a quantidade, a espécie de percepção, de ligação que esse nosso antiquíssimo irmão tinha com Real?  Podemos saber muito desse homem, que no fundo era parecido com a gente. Que coisa doida, parece que estamos a milhares de anos aprendendo a usar o cérebro, porque o corpo já está pronto a milhares e milhares...Par ser bem franco, podemos acessar muito desse nosso ancestral, muito mais pelo menos do que o grosso das pessoas pensa que pode, desses homem e mulher que aos nossos olhos podem parecer uma mistura de índio de bang bang com o Macgwayver, um ser humano igual a nós ao ponto de vestido como um homem de hoje passar tranquilamente desapercebido por entre a multidão ou ainda mais; se quando pequeno fosse roubado aos seus pais e criado como uma criança moderna também seu comportamento e cultura, e sua percepção do que fomos no passado, tudo seria condicionado ao meio em que crescesse e nada a diferenciaria de outras brincando no patio da escola durante o recreio.


O PODER DA ARQUEOLOGIA PARA NOS DEMONSTRAR VERDADES FENOMENOLÓGICAS DO PASSADO DA ESPÉCIE HUMANA

    O que sabemos afinal? Sabemos sobre sua dieta, sobre suas migrações, sobre seus rituais fúnebres e sua relação com o fogo e com o céu. A arqueologia já demonstrou por varias vezes que muito antes de aprendermos a escrever já observávamos e aprendíamos sobre o céu e sua fenomenologia, e pelo estudo das espécies e das suas transformações em nosso rastro migratório, a enormidade enciclopédica de artefatos recuperados do interior da terra nos permite reconstruir camadas muito sofisticadas da vida e do pensamento do homem de 40 mil anos. Por exemplo, a representação da mulher, do corpo feminino, tem uma constante morfológica que não pode passar desapercebida quando num período muito grande dentro do calendário migratório do homem mantem-se pouco alterada em um sitio arqueológico quase 5000 quilômetros longe um do outro. Transformações, por vezes meras adaptações ao novo tipo de rocha disponível para confecção de ferramentas servem de mapa das movimentações humanas, de sua adaptabilidade aos novos matérias que utiliza em sua construção tecnológica e também nos informam, mesmo que de modo indireto, muito mais do que apenas seus hábitos e caminhos percorridos. Analisando a natureza física de seus objetos, o tipo de manufatura envolvida e o tempo dispendido, podemos fazer conjecturas, podemos criar hipóteses plausíveis, algumas mesmo incrivelmente prováveis, sobre o que pensavam e o que queriam, sobre o que desejavam estes humanos tão distantes e no entanto, como veremos a seguir, tão próximos de nós em tantos aspectos.






Estatuas do período Paleolíticos. Elas são chamadas de Vênus









VAMOS FOCAR NO PERÍODO DAS FLAUTAS, SIM?

           No ano 40 mil AC, estamos no período paleolítico superior – os limites entre o paleolítico inferior e o superior estão mais claros do que os limites do paleolítico médio, ao menos na sua divisão com o superior, mas para o nosso caso opto por chamar de superior o período que quero abranger, entre os 40 e os 30 mil AC – e o homem europeu vive em cavernas porque a Europa desse momento histórico está congelada. Dentro dessas cavernas, protegidos das intempéries e do vandalismo, saímos de nossa nave do tempo e, analisando a estatuária que encontramos enterrada descobrimos que a representação da mulher, com tudo aquilo que chama a atenção do homem - os clichês mesmo – são representados grandes, num corpo deliberadamente obeso, as vezes um pouco apenas mas em outras completamente fora de proporção.

CUIDADO COM ESTA PARTE, E LEMBRE DE QUE SÃO apenas CONJECTURAS

     A idéia é que esses humanos, observando o nascimento de outros animais, e observando os de sua própria espécie, tinham a mulher como a força que gerava sua espécie, e numa analogia com o que acontece em uma colmeia, há quem chegue a cogitar numa organização social onde a mulher e não o homem era o gênero dominante.
     E muito impressionante, quase hipnótico o que podemos entender sobre nossa espécie e por consequência sobre nós mesmos, pensando sobre os objetos encontrados e as condições em que foram manufaturados. O tempo evolutivo que é preciso considerar para que o ser humano tenha conseguido sofisticar sua capacidade de precisão mecânica e o conhecimento sobre as ferramentas que utiliza – e o próprio tempo necessário para a evolução destas ferramentas, que deve ser basicamente o mesmo momento histórico da sofisticação dos artefatos encontrados (não podemos sofisticar a produção de um objeto sem antes sofisticar ou as ferramentas ou os meios de as utilizar), e não consigo imaginar que possuindo a capacidade de precisão, o ser humano não vai representar cada vez com mais clareza o mundo que o rodeia – o tempo necessário para este aprendizado todo é muito longo, mas em suas formas mais acabadas, mais próximas dos 40 mil, nos contam indiretamente que esse humano, que esse ser ainda diferente de nós em sua cultura mais fundamental, que não seria comparavel talvez nem com os mais atrasados de nosso mundo, esse humano que vivia dentro de uma caverna e ainda jogava os seus mortos junto com os restos de comida, esse mesmo humano desenhava nas paredes, com até meia duzia de cores diferentes – o ocre vermelho mais do que qualquer outra cor – as vezes com surpreendente capacidade de representar proporções e movimento! Acredita-se que usava além dos dedos e palmas das mãos, bastões de madeira com a ponta macerada, num simulacro de pincel de pano. Pintavam até cuspindo a tinta e usando a mão como negativo. Pensem nestas pessoas cuspindo a tinta – que de alguma maneira foi preparada antes deste momento, prescindindo por sua vez também toda uma história de conhecimento agregado – e se afastando um pouco da parede e conferindo, conforme o que tem na sua mente – não temos como saber se é uma paisagem lembrada, ou um recado ou algum código mistico – se o resultado, e frise bem esta palavra - o resultado de sua obra - estava de acordo com sua representação mental!
     Existe ainda, é claro, uma outra categoria de objetos arqueológicos que é encontrada pela primeira vez no Paleolítico superior; flautas. As encontramos confeccionadas em pedaços de marfim e em ossos de abutres, a mais antiga com 45 mil anos é confeccionada em osso de urso, e pela sua feitura podemos saber que ela é também resultado de uma evolução anterior. É incrivelmente improvavel que formas bem acabadas de tubos produtores de sons articuláveis em notas – tenham sido produzidas já nas primeiras tentativas, e mesmo estas varias tentativas devem ter acontecido, repetindo-se em longos vai-e-vem tecnológicos – influenciados pelo clima, pela região ou mudança desta.




Um humano - ou mais de um - fez esta flauta a 35 mil anos

    Por mais extraordinário que seja, eles já tinha tinham notas especificas, fenomenologicamente para o ouvido moderno um rascunho de escala, (conceituando aqui escala como uma seleção de graus de uma cromatismo dado que não sabemos se era em 12 ou menos partes, duvido  que em muito mais)




flauta de osso de urso - 41 mil anos

a arqueologia nos ensina que o ser humano, em varias partes do seu percurso evolutivo, tanto no tempo quanto no espaço, inventou e reinventou as mesmas soluções tecnológicas para seus problemas, e o curioso é que em muitas escavações vê-se, ao analisar material recuperado, que existe mais variação estilística entre os artefatos do que uma melhora constante na tecnologia empregada ou no resultado do objeto criado.             Com certeza meu amigo, a flauta de osso de abutre que chegou até nós não foi a primeira e nem a milésima construída. Aquilo para o que quero chamar a tua atenção é um aspecto específico, embutido mas desprezado numa leitura mais leviana, formal, descritiva; desde a 45 mil anos atrás, por ene razões, mas tenha como um fato, que a 45 mil anos atrás assim como pintava e olhava seu trabalho, o homem também gastava horas – dezenas delas – calmamente escavando buraquinhos em um osso de ave, cuidando para que os orifícios estejam do tamanho certo para o encaixe dos dedos, e evidentemente sabendo que o uso a ser feito deste instrumento é o de produzir sons articulados!
    Mais do que a já surpreendente percepção de que eles identificavam notas e certamente células rítmicas, o que quero dividir contigo é que esse ser fazia isso, interagia ativamente e não apenas como um ouvinte animal; assim como com a representação pictórica, e assim como a escultura, a estatuária, o homem Pré-Histórico também interagia com a dimensão sonora, que em termos de biologia, significa lidar com o som racionalmente, manipulando notas e ritmos - quaisquer que tenham sido eles – os organizando no tempo e na altura com a única ferramenta que temos para isso; nossa capacidade matemática

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