sexta-feira, 27 de abril de 2012

    Senhores, Porto Alegre é uma cidade estranha. Em termos de instrução musical, existe picaretagem para todos os gostos, desde o modelo escolinha de música, onde nossas crianças e às vezes nós mesmos somos não ensinados mas adestrados para repetir as peças que o professor nos ensina - isso quando é uma peça e não algo ainda pior, como um simples trecho de música, um verdadeiro horror; crianças e jovens inteligentes e capazes sendo tratados como imbecis - até os pica fumos que não sabem o que fazer com o instrumento mas já estão ministrando aula. O que leva o picareta a gastar mais tempo construindo sua picaretagem do que estudando e realmente aprendendo alguma coisa é assunto para outra postagem. Preciso hoje escrever sobre o maior de todos eles, o picareta mor de Porto Alegre, e preciso fazer isso porque ouvi uma aula dele ontem - temos um aluno em comum que gravou uma aula com ele e mostrou-me - que me impressionou muito. 
    Já vi gente ruim e gente boa trabalhando, alguns só hoje vejo o quanto eram bons no seu trabalho, ou ruins mesmo que não sabendo que o eram. Uma vez, numa Oficina em Curitiba, isso em 1997, a Mara Campos, durante o ensaio de uma peça do Osvaldo Lacerda chamada Provérbios, parou e disse que precisava estudar a peça, pediu desculpa aos alunos presentes e passamos para outra música. A peça que ela parou porque não conseguiu ler era apenas falada, sem entonação, e o Osvaldo fez o diabo com o texto, montando uma fuga à 4 vozes apenas com a estrutura rítmica, que era bem complicado de fazer funcionar. No outro dia ela chegou no ensaio com a peça decorada, todas as vozes. Até hoje tenho isso como um exemplo duplo. Primeiro de honestidade; ela disse com todas as letras que precisava parar porque tinha que estudar, mostrando que não tinha nenhum medo, nenhum problema em admitir que não sabia, e segundo pela sua capacidade de estudo, de foco e constância, e até um terceiro exemplo, que é o de entender que moralmente seria muito útil aos seus alunos, ver que ela se esforçou além de estudar o que se propôs, e internalizou todo o conteúdo. Não tem muita coisa dela na net mas é uma ensaiadora muito capaz e com um domínio rítmico muito apurado e o gestual claro de quem tem o clic na cabeça. 
    Outra vez, num ensaio onde um jovem e inexperiente regente coral tentava fazer um Agnus Dei do Hassler - um em F Maior - funcionar, deu-se o oposto. O desgraçadinho do guri era tão ruim (mas tão ruim) que não entendia nem que na peça em questão era fundamental pensar em 2 e não em 4 como ele estava fazendo. O resultado era que a peça soava muito rápida, muito magra na sua divisão e sem o sustain que é tão característico do período. As pessoas são leigas e não se dão conta, e o regente esse, parecia também não ter a menor idéia do tamanho do erro, e testemunhei muitas apresentações dele e do seu coro cantando o Hassler errado. Houve uma ocasião em que uma regente vaio cantar com eles - ela apresentou-se com o seu coro no mesmo evento e, sabendo que o coro do regente esse cantava a peça, veio cantar junto, a coitadinha - e a expressão dela durante a execução era de desconforto extremo, como se ela dissesse, meu deus, o que foi que eu vim fazer aqui, por que isso, por que comigo? o que foi que eu fiz? O regente imbecil, este, a propósito, era eu.
   Mas eu comecei dizendo que Porto Alegre é uma cidade estranha; os picaretas da instrução musical aqui de Porto Alegre também são médiuns. Sim, senhoras e senhores, os picaretas da instrução musical aqui na capital dos gaúchos são guiados na sua forma de lecionar Música por nada mais e nada menos do que espíritos desencarnados! o professor este, figura arqui conhecida da cena, "trabalha" do seguinte modo; seus alunos mais destacados são os que conseguem imitar mais exatamente o que ele próprio faz. De fato, existem pessoas que conseguem imitar muito bem o que ouvem, e é um grande erro subestimar nossa capacidade de mimetizar o que ouvimos, mas isso, no meu entendimento, não é saber, não é aprender, não é conseguir manipular a informação, o conhecimento, os modelos técnicos, as sensações fisiológicas do processo de cantar. Sim, falo de um professor de canto. Evidentemente um professor que trabalha assim  tem todo o interesse em mostrar o canto como algo extremamente difícil, apreensível somente por meios subjetivos e que, claro, somente ele, o professor, detêm.  A Merda disso é que um jovem sem experiência de ouvir cantores e sem nenhum referencial externo realmente acredita que este falsário realmente sabe de alguma coisa além de cantar alto - na boa ele nem ao menos é um bom cantor, não tem cultura de repertório nenhuma e de maneira parecida com as bandas de música pop dos 70 e 80, vive repetindo as mesmas árias de ópera, a mesma micagem de agudos - ele chega a fazer de conta que não alcança as notas para depois canta-las na altura. Jamais, no entanto, ouvi falar de ele se envolver seriamente em nenhuma récita que não seja uma sequência de clichês. Gente assim macula a formação, o ouvido crítico de nossos jovens, gente assim é um desserviço para a formação musical de nosso estado - não é atoa que estudando com pessoas como ele, o RS conte nos dedos os cantores que são expoentes nacionais e internacionais. E, quando o cantor não consegue imitar o seu vocalize, ele para, finge ouvir uma voz de espírito - isso é serio, eu ouvi a gravação e dá pra escutar ele murmurando, falando sozinho, e diz - repetindo a opinião do espírito - que o cantor não entende o que ele ensina, que o que ele está ensinando serve para o Pavarotti, para a Callas, mas que o cantor, no caso um jovem de 22 anos, não entende. É isso, esse imbecil desconsidera o quanto o aluno leva a sério uma coisa destas, este imbecil desconsidera o quanto ele é responsável pela formação deste jovem. Gente assim não pode acontecer mais, culturalmente, pessoas assim são um tumor cultural;   Cidadão Imbecil na Décima Potência.

Um comentário:

  1. Já estou te seguindo. Espero você também no blog Ideias em Arte-Educação

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